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Golpe no Fundeb: deputados aprovam destinação de 10% dos recursos para iniciativa privada

Os beneficiários são escolas ligadas a igrejas, entidades filantrópicas e o ensino técnico profissionalizante do Sistema S, que já era financiado pelo salário educação

Publicado: 11 Dezembro, 2020 - 10h21

Escrito por: Confetam

Reprodução da Internet
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Relator Felipe Rigoni: das 44 emendas, foram contempladas quatro no relatório final.

Entidades ligada à educação e do movimento sindical criticaram pontos do projeto que regulamenta o novo Fundo de Desenvolvimento da Educação Básica (Fundeb), aprovado na quinta-feira 10, na Câmara dos Deputados.

Em plenário, os parlamentares incluíram escolas ligadas a igrejas, entidades filantrópicas e o ensino técnico profissionalizante do Sistema S entre as instituições que podem ser beneficiadas com recursos do principal mecanismo de financiamento da educação básica no País, que abocanharam até 10% dos recursos da chamada complementação da União.

Para Vilani Oliveira, presidente da Confederação dos Trabalhadores no Serviço Público Municipal (Confetam), a mudança no texto, além de desnecessária, é uma maneira da ala conservadora do Congresso, ligado à Bancada da Bíblia, e ligada ao capital privado, que saíram derrotados na votação da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que tornou o Fundeb política pública permanente, de fazerem valer seus interesses.

“O que assistimos foram os parlamentares, possivelmente aliados a prefeitos e outros atores interessados nos recursos da educação, criarem uma regra que vai permitir fazerem não só a transferência de recursos públicos para instituições privadas como também possibilitar que a grana seja moeda de troca na politicagem. Um grande retrocesso”, definiu a dirigente nacional.

Em nota, a Campanha Nacional Pelo Direito à Educação afirmou que a ampliação de conveniamentos colabora com a privatização da educação via “Sistema S”, além de colocar a medida como inconstitucional.

“Além de aprofundar a privatização da educação, sobrefavorece o Sistema S, já beneficiado pelos recursos do Salário-Educação. Com isso, transfere ainda mais dinheiro público às instituições privadas, drenando uma enormidade de recursos que deveriam melhorar a qualidade das escolas públicas. O conveniamento com instituições privadas de educação não só não pode avançar, como também é necessário que se definam travas e prazos de transição em relação ao cômputo de matrículas e a repasses de recursos públicos para essas unidades. Por isso, não é possível permitir o cômputo de dupla matrícula como defende o relator, sem quaisquer garantias de universalidade e gratuidade por parte das conveniadas. Aliás, esse conveniamento proposto por Felipe Rigoni (PSB-ES) é inconstitucional, pois fere o art. 213 da Carta Magna”, diz o texto da entidade.

A União Brasileira dos Estudantes Secundaristas (UBES) disse que a regulamentação do Fundo é uma vitória, mas a inclusão de entidades ligadas ao Sistema S é “arbitrária”.

“Mas a base do governo Bolsonaro atropelou mais uma vez o acordo para aprovar recursos do FUNDEB exclusivos para a educação pública. Nós estudantes, reforçamos que o destaque 6, apresentado pelos partidos PSL, PTB e PS, no qual inclui as matrículas de educação profissional técnica de nível médio oferecidas pelo Sistema S na distribuição dos recursos do FUNDEB não é justo. Isto permite a parceria ou conveniamento dos serviços nacionais de aprendizagem, como entidades filantrópicas, as autarquias e fundações públicas, para aplicar a formação técnica e profissional do ensino médio aos estudantes da rede pública. Este destaque tira o papel fundamental da LDB, do educador e profissional da educação, que está presente diariamente no cotidiano dos estudantes. Vale ressaltar que o Sistema S já recebe recursos de entidades patronais, comerciais e de doação e, agora, público. Esta é uma decisão arbitrária e que causa um “apartheid educacional” no país, no qual penaliza os mais pobres, explorados e excluidos da sociedade. A regularização do Fundeb hoje é um passo positivo no futuro da educação de milhares de estudantes brasileiros”, manifestou a organização estudantil.

Parlamentares defensores da educação reagem

As duas emendas geraram polêmica no plenário. A proposta relativa ao Sistema S e entidades filantrópicas foi aprovada por 258 votos a 180. Já a que incluía escolas religiosas e filantrópicas foi aprovada por 311 votos a 131.

As instituições comunitárias, confessionais e filantrópicas poderão receber recursos para até 10% das vagas do ensino fundamental e médio –  a atual legislação do Fundeb permitia o repasse apenas para educação infantil e pré-escola. A emenda foi proposta pela deputada federal Soraya Santos (PL-RJ).

Já a emenda que favorece as entidades do Sistema S era de autoria da deputada Luísa Canziani (PTB-PR).

Ambas as propostas receberam apoio do governo Bolsonaro. Criticado pela oposição, o relator, deputado Felipe Rigoni (PSB-ES), votou contra os destaques e negou ter rompido acordo para mudar o texto.

Nas redes sociais, parlamentares da oposição reagiram.

Marcelo Freixo (PSOL-RJ) disse que é “lamentável” e criticou o que chamou de “emenda do Novo”, que passou a permitir que o Fundeb seja usado para pagar funcionários de instituições privadas de ensino.

“Noite amarga para educação pública. O Fundeb, formulado para fortalecer a escola pública, ficou prejudicado em sua regulamentação e acabará transferindo dinheiro público para a iniciativa privada. Os deputados que traíram o povo brasileiro precisam ser cobrados. Seguimos na luta”, disse a deputada federal Sâmia Bomfim (PSOL-RJ).

Líder da minoria na Câmara, o deputado José Nobre Guimarães (PT-CE) chamou a medida de “golpe na educação”. Para ele, “a direita mostrou as garras”. Embora com resistência, a correlação de forças estava a favor do Governo e das organizações privadas. “Oposição demarcou posicionamento contrário, mas fomos vencidos. A educação pública e gratuita, mais uma vez, foi golpeada. Lamentável!”, concluiu o parlamentar.