O efeito da Reforma Administrativa será mais catastrófico nos municípios
O alerta é da secretária de Combate ao Racismo da Confetam/CUT, Vilani Oliveira. Leia a íntegra da entrevista
Publicado: 06 Outubro, 2021 - 14h02
Escrito por: O Serviço Público é Feito por Pessoas
A pedagoga feminista, Vilaní Oliveira, presidenta da Contram/ISP (Confederação dos Trabalhadores Públicos Municipais das Américas) e secretária de Combate ao Racismo da Confetam (Confederação dos/as Trabalhadores/as no Serviço Público Municipal), fala sobre o alcance nocivo da PEC 32 que impactará na administração pública dos municípios brasileiros
A PEC 32 versa sobre o serviço público federal. Mas, na sua avaliação, se for aprovada, a Reforma Administrativa alcançará os serviços públicos dos estados e dos municípios?
A gente já vive uma situação de extrema penúria; de retirada de direitos, de perseguição, de precarização dos serviços públicos e da mão de obra. As reformas iniciais, todas elas, tiveram impactos em nossas vidas laborais. Se enganou quem dizia que a Reforma Trabalhista, a Reforma da Previdência, a Lei da Terceirização não chegariam ao serviço público. Todas essas reformas, hoje, já são uma realidade na maioria dos municípios deste país. Então, a PEC 32 alcançará sim estados e os municípios.
Você consegue antever os impactos da Reforma Administrativa?
O efeito será mais catastrófico nos municípios. Passando a PEC 32, nós, servidores públicos municipais, e a população mais pobre, mais carente, que mais precisa de atenção do estado, seremos os mais penalizados. Exatamente, aqui, na ponta, nessa menor unidade da federação, é que as coisas acontecem. Os serviços públicos de limpeza, saneamento, água, energia, atenção básica da saúde… serviços primários; as escolas, as creches, a educação básica. É, aqui, nos municípios, que essas políticas acontecem, e a incidência será catastrófica.
De um lado, uma das grandes críticas à PEC 32 é de que ela favorecerá a privatização de serviços públicos. De outro lado, há quem defenda a privatização como necessária para melhorar os serviços que hoje são responsabilidade do estado… O que pensar sobre isso?
Hoje, nós temos uma precarização do SUS [Sistema Único de Saúde]. Mesmo com todo o sucateamento que fizeram, com todos os cortes de verbas que fizeram, o SUS vem se agigantando no combate à covid-19, nas vacinas, no tratamento das pessoas. Agora, vamos imaginar esses serviços sendo prestados pela iniciativa privada… Qual serviço, privatizado ou terceirizado, melhorou para os trabalhadores ou para os usuários na ponta? Nenhum. Em todos, eles precarizaram a mão de obra, passando a prestar serviços de péssima qualidade. Então, a Reforma atinge a grande massa da população que vai pagar mais caro. A água privatizada é o exemplo clássico. Falta água na torneira, mas não falta a conta todos os meses. O Brasil anda na contramão do que muitos países da Europa já estão fazendo. Antes, eles privatizaram certos serviços e agora estão reestatizando, porque não deu certo. O serviço ficou precário, e verificaram que penalizaram os que mais precisam de serviço público.
Vamos falar sobre o fim da estabilidade. Como você imagina que ficaria a administração pública, num cenário sem estabilidade, especialmente nos municípios menores?
Uma porta escancarada para a corrupção. Vamos ver uma leva de servidores sendo exonerados, com o fim da estabilidade. Mas, quem perde também é a população que não tem aquele serviço qualificado, com continuidade. Sai prefeito e vai sair junto uma leva de trabalhadores e trabalhadoras. Entra prefeito, vai entrar outra leva de trabalhadores e trabalhadoras. São servidores com estabilidade que tiveram coragem de, em muitos casos, fazer denúncias. Quem é o servidor, que é cargo político, que não é concursado ou que não tem estabilidade, que vê um mal feito acontecendo e vai denunciar? Não vai.
O discurso propagado é que a estabilidade é privilégio dos servidores…
A estabilidade não é uma prerrogativa apenas para o servidor do cargo. Eles utilizam a desculpa de que o servidor comete falhas, erros e nunca pode ser demitido. Não é verdade. Muitos servidores são demitidos, mediante avaliação, mediante processo disciplinar em que se verifica se realmente o ocorrido fere os princípios da legalidade… Muitas vezes, os servidores são exonerados. Então, o servidor não está ali para a vida toda. Ele é avaliado. É correto que sejamos avaliados! Nós não temos medo de sermos avaliados! A primeira avaliação que nós nos submetemos já foi no concurso, para saber se estávamos aptos a exercer aquela função. Passamos também três longos anos no estágio probatório, sendo avaliados.
E quanto à cláusula sobre avaliação por desempenho?
O problema da avaliação por desempenho é que, na lei, muitas coisas serão regulamentadas a posteriori. Então, não se tem certeza exatamente como se dará essa avaliação. A gente sabe muito bem como essas avaliações por desempenho são realizadas: pelo chefe imediato que, muitas vezes, tem algum problema político com o servidor. Nem sempre, o chefe imediato é concursado, bom lembrar que são cargos políticos! Muitas vezes, ele persegue o servidor, porque não vota no prefeito, porque não vota nos vereadores do prefeito. Tudo é motivo para colocar uma avaliação negativa.