PEC dos Precatórios de Bolsonaro afetará trabalhadores
Proposta permite ao governo parcelar débitos gerados por ação judicial, como as do Fundef
Publicado: 12 Agosto, 2021 - 17h14
Escrito por: André Accarini e Rosely Rocha
O governo de Jair Bolsonaro (ex-PSL) quer parcelar precatórios, dívidas do governo que a Justiça manda pagar, a maioria relacionada a ações de revisão de salários de servidores públicos e aposentadorias, que demoraram anos e anos para serem julgadas.
É disso que trata a Proposta de Emenda à Constituição dos Precatórios (PEC) nº 1.061, enviada ao Congresso pelo governo Bolsonaro. Em resumo, é uma proposta que afeta brasileiros que aguardam há muito tempo para receber o que têm direito. E é eleitoreira porque, com o dinheiro tirado de trabalhadores, aposentados e seus familiares porque alguns já morreram, o governo pretende bancar o recém anunciado programa Auxílio-Brasil, que deve substituir o Bolsa Família.
A PEC propõe parcelar os valores que a Justiça mandou pagar referente a ações vencidas em todas as instâncias, em 10 anos, já a partir de 2022. Ou seja, quem entrou com ação para rever valores de benefícios, dependendo do valor, vai demorar ainda mais para ver a cor do dinheiro. É o caso de muitos idosos que pediram revisão do benefício e aguardam há anos – às vezes 15, 20 anos – para receber o que têm direito. Muitos morreram e seus familiares também serão afetados se a PEC for aprovada.
Isso, sim, é uma pedalada!
“Do ponto de vista fiscal, o nome disso é pedalada”, diz Bruno Moretti, economista, especialista em orçamento e assessor no Senado Federal.
Ele explica que atrasar despesas gerando ‘artificialmente’ um espaço no orçamento para que o governo possa fazer gastos visando recuperar a popularidade, de olho nas eleições do ano que vem, é pedalada fiscal.
O termo pedalada define um tipo de manobra contábil feita pelo Poder Executivo para cumprir as metas fiscais, fazendo parecer que haveria equilíbrio entre gastos e despesas nas contas públicas, o que é considerado um crime de responsabilidade.
Bruno critica o fato do parcelamento afetar muitas ações que envolvem benefícios previdenciários e assistenciais de brasileiros que precisaram recorrer à Justiça para receber um direito garantido por Lei.
“São pessoas que lutaram por muitos anos na Justiça para ter direito a receber e, agora, serão impedidas de acessar o que conquistaram por causa do atraso do governo”.
Além disso, prossegue o economista, a medida joga para os próximos governos, pós-Bolsonaro, arcarem com essas dívidas, impedindo-os de realizar outros investimentos. “Há um impacto muito grande para essas pessoas”.
"E do ponto de vista fiscal é manobra para defender o teto de gastos, que tanto faz mal a sociedade, ao mesmo tempo em que contorna esse teto com vistas a gerar despesas oportunistas, olhando a eleições" - Bruno Moretti
O Teto de Gastos Públicos foi aprovado pelo Congresso Nacional em 2016. De autoria do governo de Michel Temer (MDB-SP), a Emenda Constitucional (EC) nº 95 congelou os investimentos públicos até 2036, obrigando a União a limitar o crescimento do seu orçamento ao equivalente à inflação do ano anterior. Economistas progressistas criticam o Teto de Gastos. Segundo eles, a regra impede a retomada da economia, por falta de investimentos governamentais.
Para Bruno Moretti, a PEC deveria ser derrotada pelo Congresso tendo em vista o impacto que gera. “É fundamental ampliar a transferência de renda, mas é preciso rever o teto de gastos com transparência e explicando à sociedade que é fundamental apoiar as pessoas mais vulneráveis”.
E não é isso que o governo faz. Na verdade, segundo Moretti, cria artifícios fiscais prejudicando pessoas para fazer despesas de seu interesse.
A proposta do governo
Se a PEC for aprovada, o parcelamento poderá ocorrer já partir de 2022.
O texto prevê três faixas de valores:
-Até R$66 mil: pagamento continua sendo em uma única parcela (à vista);
-De R$ 66 mil e R$ 66 milhões: se a soma total de precatórios devidos pela União ultrapassar 2,6% da receita corrente, o pagamento será parcelado em 10 anos;
-Acima de R$ 66 milhões: pagamento parcelado em 10 anos, sendo 15% à vista.
Além do parcelamento, o governo quer diminuir os juros pagos em caso de atrasos do pagamento dos precatórios. Pela regra atual, as dívidas são corrigidas pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor (IPCA) mais os juros da poupança, ficando em torno de pouco mais de 10%. A PEC prevê a correção pela taxa básica de juros, atualmente em 5,25% ao ano. Ou seja, os juros caíram quase que pela metade.
Precatórios
Os precatórios são dívidas da União após ação judicial cujo valor é de mais de 60 salários mínimos (acima de R$ 66 mil, neste ano). São dívidas que os governos federal, estaduais e municipais são obrigados a pagar por determinação judicial referente a ações vencidas em todas as instâncias da Justiça – ações em os governos não podem mais recorrer.
Por exemplo, quando um beneficiário da Previdência entra com uma ação na Justiça e ganha, isto gera um precatório. O mesmo ocorre com a desapropriação de terras e casas para a construção de rodovias, metrôs etc, entre outros tipos de dívidas devidas também às instituições e empresas.
Fundef
Entre os prejudicados pela PEC estão os trabalhadores e trabalhadoras da Educação, além de municípios e estados que “ganharam” na Justiça precatórios do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de Valorização do Magistério (Fundef), mas até hoje não “levaram” por causa do calote da União na Educação pública e nos seus profissionais.
De acordo com a presidenta da Confederação dos Trabalhadores no Serviço Público Municipal (Confetam/CUT), Jucélia Vargas, os servidores e servidoras da rede de ensino municipal de todo o país acrescentaram mais este item à pauta de reivindicações da Greve Geral do Serviço Público: derrotar a PEC dos Precatórios.
"No dia 18 de agosto, vamos às ruas de todo o Brasil para denunciar mais esse golpe do desgoverno fascista de Jair Bolsonaro contra a educação pública brasileira”, reagiu Jucélia à proposta de fatiamento do pagamento dos precatórios do antigo Fundef.
Edição: Marize Muniz e Déborah Lima